o espelho

Eu fui uma criança triste. É o que minha mãe diz. Eu levava isso como ofensa até hoje. Parando para analisar os poucos momentos que lembro da minha infância, eles são todos melancólicos. As memórias que guardamos temos justamente porque elas envolvem emoções, assim as registramos. Bom, todas as que tenho são tristes ou levemente assustadoras. Mas não assustadoras com motivo, era apenas o sentimento que eu tinha. 

Hoje, percebo que eu sempre fui uma criança com depressão e ansiedade, vivia com medo de tudo e em constante adrenalina por consequência. Porém, essa adrenalina era contida, quieta, não falava pra ninguém. Afinal, eu achava normal. 

Eu já tinha tendências melancólicas, histórico familiar de doenças mentais, dificuldades de interagir com outras crianças, olhos atentos e boca calada. Tenho memórias visuais da minha infância, algumas. São cenas felizes, mas meu sentimento é confuso. 

Ao passar do tempo, minha questão social melhorou um pouco. Conseguia fazer poucos amigos e me comunicar de maneira mais natural (como outras crianças da minha idade). Acredito que eu conseguia mascarar bem. Então, meu pai faleceu e eu enterrei tudo. Foram tantas coisas, de maneira tão rápida, que não tive tempo nem de ver o que eu estava enterrando. Tanto que até hoje acho que não vivi o luto de fato. Porém, hoje é tarde demais para sofrer por algo que aconteceu há mais da metade da minha vida. Eu sei viver mais sem ele do que com. Mas, não converse comigo nos dias dos pais, é quando lembro do que já tive e do que eu poderia ainda ter.

Apesar de tudo muito bem enterrado, eu ainda era uma adolescente triste e  com muito sono. Todo verão eu entrava em crises depressivas e ansiosas, mal conseguia comer, tinha enjoos fortes, tontura, cansaço e uma angústia absurda. Chegava a emagrecer mais de 5 quilos em menos de um mês. Era tudo inconsciente, nenhum distúrbio alimentar. 

Aos 17, tive uma crise de pânico enorme e que desencadeou tudo que tinha sido enterrado. Tomo medicamentos desde então e (talvez) sem previsão de alta. São 10 anos tomando remédios para uma doença que vivi com ela a vida toda, aparentemente. 

Pensei que eu era assim por não ter recebido o carinho que eu merecia minha vida toda, mas ninguém tinha como saber o sofrimento que eu passava se nunca disse. Ninguém tem culpa direta sobre minha incapacidade de ter carinho por mim mesma.

Fugindo, mas nem tanto, do assunto, essa semana eu estava triste e carente de cuidado. O primeiro pensamento que tive é de querer a minha mãe. Mas, milissegundos após  percebi que a minha mãe não poderia fazer isso. Afinal, ela nunca fez. Eu queria a "minha mãe" versão romantizada que o mundo vende sobre a figura materna.

Agora, me vejo tendo que ser minha própria mãe, amiga, companhia, amante... mas todos parecem papéis falsos. A verdade é que eu sempre fui a minha própria inimiga. O resto foi tudo interpretação. 

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